Morar fora por
opção, necessidade ou oportunidade traz consigo encantos, descobertas e
desafios. Uma das descobertas que fiz foi a de que eu tenho
"baterias" que necessitam de uma carga muito específica.
A vida útil tem
cerca de um ano e meio, e, por volta de dois anos, o sistema entra em pane
total. A motivação diminui, os olhos deixam
explícita a melancolia, certas músicas provocam alucinações - vejo lugares e
ouço vozes de pessoas que estão muito distantes. Sons e imagens que não pertencem
ao meu atual endereço.
Foram
necessários alguns ciclos para eu entender esse processo e reconhecer a causa -
bateria sem carga. A ficha caiu numa das viagens que fiz ao Brasil, por volta
das 6 da manhã, quando o comandante do avião, no toque de despertar, e num
rompante de espontaneidade, diz: "Senhores passageiros, bom dia! Acabamos
de entrar no espaço aéreo do Brasil, estamos sobrevoando a região amazônica. A
todos a bordo, sejam muito bem-vindos ao Brasil e, para os brasileiros que
vivem fora, estamos em casa!"
Este simples “bom
dia” causou , nesta brasileira imigrante, choro compulsivo. O gringo ao meu lado, coloca o dedo no meu ombro e pergunta: Are you
ok?, e eu, em estado de transe, patriotismo à flor da pele, com o coração
disparado, respondo que sim e logo volto a me concentrar na sensação que, por
mais que eu tente, não dá para traduzir em palavras.
Chegando a BH, vi a Serra do Curral linda, margeando o belo
horizonte. Foi aí que a coisa da bateria ficou ainda mais clara. Descobri a
fonte de energia enquanto sobrevoava a rodovia 262, olhando as montanhas de
Minas pela janela do pequeno avião. Agora a sensação era de alegria, felicidade!
Eu ansiosa, estava prestes a pisar na terra onde nasci.
À medida que o
avião descia, eu reconhecia os campos, encantava-me ao reencontrar o amarelo
forte dos ipês floridos. Estava novinha em folha. Nem sentia as mais de 20
horas entre aviões e aeroportos.
Nesta viagem fiz
mais do que carregar: troquei a bateria. Fiz doce de leite em tacho de cobre,
calcei a botina e comi o pó da estrada. Assisti à festa do Rosário, a
apresentação de ternos de congado em Dores do Indaiá, batizei meu sobrinho
Bernardo e observei, de perto, várias mudanças ao andar pelas ruas de Araxá e
de Tapira. O tempo passa, as coisas mudam. Algumas, para muito melhor e outras,
nem tanto assim. Ainda bem que tenho memória fotográfica.
Quanto mais ando pelo mundo, mais perto estou da minha origem. Estou ligada à minha Minas Gerais – o centro do universo.